17.03.2021 |
Audição do CPC pela Comissão de Saúde da Assembleia da República
Vai celebrar-se, de 15 a 21 de março, a Semana do Cérebro, numa iniciativa da “Dana Alliance for Brain Initiatives” (EUA) e da “European Dana Foundation for the Brain” (Europa), com o objetivo de fomentar a discussão e o interesse públicos, a nível mundial, sobre as questões ligadas ao conhecimento do cérebro e estimular a investigação na área das neurociências. Decorridos 25 anos sobre a sua primeira edição, estas iniciativas mobilizaram, neste período, mais de 7 300 parcerias (41 em Portugal) em 117 países.
O Conselho Português para o Cérebro, que reúne as sociedades científicas ligadas ao estudo do cérebro e algumas associações de doentes, é parceiro da Dana Foundation e tem colaborado com a Sociedade Portuguesa de Neurociências, sua associada, nas atividades que, anualmente, são desenvolvidas no nosso país e que são dirigidas a dois alvos principais: as escolas e a população em geral.
Pretendemos, com elas, informar, esclarecer e dar formação nesta área que consideramos de particular relevância na sensibilização da sociedade para estas questões, tendo em vista a melhoria das suas condições de saúde e o avanço do conhecimento.
Paralelamente, e em colaboração estreita com o “European Brain Council” (EBC), que reúne os “National Brain Council” da maioria dos países da União Europeia, procuramos chamar a atenção para as doenças do sistema nervoso e para a importância do investimento na sua investigação, como forma de melhor prevenir e tratar estas doenças e assegurar uma melhor qualidade de vida à população.
Estima-se que as doenças cerebrais (neurológicas e psiquiátricas) atinjam anualmente cerca de 180 milhões de europeus, representando perto de um terço de todas as doenças que envolvem estes cidadãos. Os custos a elas associados rondam os 800 mil milhões de euros anuais e as suas repercussões estendem-se muito para além dos sistemas de saúde, com reflexos significativos na qualidade de vida, nas tarefas da vida diária, e com implicações importantes no mercado de trabalho traduzidas numa expressiva redução da produtividade. Acresce, a tudo isto, a elevada mortalidade que lhes está associada – em 2016 estas doenças foram responsáveis por cerca de 15 milhões de mortes na Europa.
Portugal está incluído nestes estudos com números que, percentualmente, em pouco divergem dos atrás apontados, acompanhando, deste modo, o panorama geral europeu. As perturbações de ansiedade e as cefaleias são a queixa mais comum, com uma prevalência conjunta que se aproxima dos dois milhões de indivíduos afetados. Também as perturbações do humor (com mais de 500 000 doentes), as demências (cerca de 110 00), a epilepsia (mais de 50 000), a doença de Parkinson (cerca de 20 000) e a esclerose múltipla (8 000), pela sua morbilidade, representam um peso enorme para os sistemas de saúde e para a sociedade, para além do sofrimento individual que lhes está associado. As doenças vasculares (cerebrais e cardíacas) são a principal causa de morte no nosso país, ultrapassando as taxas de mortalidade por doenças malignas (mais de 32 000 e de 28 000, respetivamente, no ano de 2019).
Com o envelhecimento da população, a que temos assistido nas últimas décadas, estes números tendem a subir, como fica demonstrado em recentes estudos epidemiológicos e projeções conhecidas. Estes dados permitem planificar, com maior rigor, os cuidados de saúde e os apoios sociais necessários aos doentes e às famílias, e justificam a necessidade de uma clara aposta, não só na investigação básica e clínica, como na pesquisa de novas terapêuticas que possam atenuar os efeitos das doenças.
Neste contexto, o EBC, em conjunto com as suas organizações e as sociedades que o integram, enfatiza a necessidade de um maior investimento na investigação em Neurociências, considerada esta fulcral para o desenvolvimento e competitividade da União Europeia, a nível global. Parece-nos ser, este, um requisito chave para melhorar a saúde e diminuir o peso das doenças nos cidadãos europeus.
Pensamos ser fundamental dar a conhecer esta informação aos europeus, para que se venha a reconhecer, com amplo fundamento, a importância da investigação em Neurociências, que deve ser assumida por todos por forma a sensibilizar e apoiar os decisores políticos na discussão destas matérias. O investimento nesta área, público e privado, no interior dos países europeus, em que uma parte significativa provém da indústria farmacêutica, fica muito aquém dos valores investidos nos EUA. É crucial apostar num maior investimento, de modo a permitir avanços na ciência, melhorar o panorama da saúde no futuro e tornar mais competitiva a indústria europeia.
Foi com esta preocupação que o EBC emitiu, no último ano, um parecer dirigido à Comissão Europeia sobre a versão preliminar do “First Horizon Europe Work Programme 2021-2022 of the Health Cluster”. Nesse documento, foi salientada a importância de um maior investimento na investigação básica em todo o espetro das doenças cerebrais, sem esquecer a investigação translacional. Ao mesmo tempo foi defendido o reforço da colaboração institucional em toda a Europa, promovendo oportunidades de financiamento das parcerias na investigação em saúde, envolvendo a sociedade civil, forças políticas, instituições privadas e organizações de interesse público.
A celebração da Semana do Cérebro é mais uma oportunidade para reunir vontades e esforços que contribuam para um melhor conhecimento do Cérebro, na saúde e na doença, concorrendo, deste modo, para o avanço da ciência e para o bem estar de todos, sem exceção.
António Freire
Presidente do CPC